sexta-feira, 30 de março de 2012

Os Milagres Posteriores a Morte de Jesus (8º Sermão de Páscoa, de C.H.Spurgeon)

Sermão pregado a noite Domingo de 1º de abril de 1888.

Por Charles Haddon Spurgeon.

No Tabernáculo Metropolitano, Newington, Londres.

“E Jesus, clamando outra vez com grande voz, rendeu o espírito. E eis que o véu do templo se rasgou em dois, de alto a baixo; e tremeu a terra, e fenderam-se as pedras; E abriram-se os sepulcros, e muitos corpos de santos que dormiam foram ressuscitados; E, saindo dos sepulcros, depois da ressurreição dele, entraram na cidade santa, e apareceram a muitos..”(Mateus 27:50-53)

A morte de nosso Senhor é um prodígio ocorrido em um entorno de maravilhas. Traz-nos a memória ao diamante Koh-í-noor [1] rodeado de um círculo de pedras preciosas. Assim como o sol em meio dos planetas que o rodeiam, ofusca a todos com seu brilho, assim a morte de Cristo é mais prodigiosa que os portentos que ocorreram nesse momento. No entanto, depois de ter visto ao sol, nos agrada estudar os planetas; da mesma forma, depois de crer na morte única de Cristo, e de colocar nossa confiança Nele como o Crucificado, consideramos um grande prazer examinar em detalhes quatro maravilhas planetárias mencionadas no texto, que circundam o grandioso sol da morte de nosso Senhor.

Os prodígios são esses: o véu do templo de rasgou em dois; a terra tremeu; asrochas se partiram; os sepulcros se abriram.

I. Vamos nos referir ao primeiro desses milagres. Essa noite, não posso estender-me muito. Não tenho forças. Quero simplesmente sugerir alguns pensamentos.

Considerem O VÉU RASGADO, ou os mistérios revelados. Pela morte de Cristo o véu do templo se rasgou em dois, de cima abaixo, e os mistérios que tinham estado ocultos no Santo dos Santos, ao longo de muitas gerações, foram expostos ao olhar de todos os crentes. Começando, por assim dizer, no superior, na Divindade de Cristo, e seguindo até a parte inferior da humanidade de Cristo, o véu se rasgou, e tudo foi descoberto aos olhos espirituais.

1. Esse foi o primeiro milagre de Cristo depois de morto. O primeiro milagre de Cristo em vida foi significativo, e nos ensinou muito. Ele converteu água em vinho, como para mostrar que elevava toda a vida comum a um grau superior, e colocou em toda a verdade um poder e uma doçura que não poderiam ter estado ali, a não ser por Ele. Porem, esse primeiro milagre depois de morto, está acima do primeiro milagre de Sua vida, porque vocês recordarão que esse primeiro milagre foi feito em Sua presença. Ele estava ali, e converteu a água em vinho.

Porem, Jesus, como homem, não estava no templo. Esse milagre foi feito em Sua ausência, e isso acrescenta sua maravilha. Ambos são igualmente prodigiosos, mas existe um toque mais surpreendente no segundo milagre, e é que Jesus não se achava ali presente para falar e ordenar que o véu se rasgasse em dois. A alma havia se separado de Seu corpo, e nem Seu corpo nem Sua alma estavam nesse lugar secreto dos tabernáculos do Altíssimo; no entanto, sem importar a distância, Sua vontade foi suficiente para rasgar esse grosso véu de linho torcido e de obra primorosa.

O milagre de converter água em vinho foi realizado em uma casa particular, em meio da família e daqueles discípulos que eram amigos dessa família; porem, esse prodígio foi realizado no Templo de Deus. Existe uma singular condição sagrada sobre isso, porque foi um feito milagroso obrado nesse recinto misterioso e tremendo, que era o centro da adoração consagrada, e a morada de Deus. Vejam! Ele morre, e a própria porta do eminente santuário de Deus, rasga o véu de cima abaixo em dois. Existe uma solenidade ligada a esse milagre, como realizado pelo SENHOR, que dificilmente posso comunicar com palavras, porem que vocês sentirão em sua própria alma.

Tampouco esqueçam que foi realizado pelo Salvador depois de Sua morte, e isso coloca o milagre sobre uma luz extraordinária. Ele rasga o véu no próprio momento da morte. Jesus entregou o espírito, e eis aqui, o véu do Templo se rasgou em dois. Pareceria que Ele se preparou durante trinta anos para o primeiro milagre de Sua vida, e realiza Seu primeiro trabalho depois de morto ao momento de expirar. No instante em que Sua alma se separava de Seu corpo, nesse preciso momento, nosso bendito Senhor tomou o grandioso véu da casa simbólica de Seu Pai, e o rasgou em dois.

2. Esse primeiro milagre depois de morto ocupa tal lugar, que não podemos contemplá-lo sem considerá-lo seriamente. Foi muito significativo, colocando-se por cabeça do que eu poderia chamar uma nova dispensação. O milagre de converter água em vinho abre Sua vida pública, e estabelece a chave dela. Esse outro, começa Sua obra depois de Sua morte, e marca seu tom. O que significa?

Por acaso não significa que a morte de Cristo é a revelação e a explicação dos segredos? Dissipa todos os tipos e sombras da lei cerimonial; os dissipa porque se cumprem e se explicam na morte de Cristo. A morte do Senhor Jesus é a chave de toda filosofia verdadeira: Deus encarnado, morrendo pelo homem: se isso não explica um mistério, então não poderá ser explicado. Se com essa corda em sua mão, não podes seguir o labirinto dos assuntos humanos, nem podes aprender o grandioso propósito de Deus, então não podes segui-lo de todo. A morte de Cristo é a grande rasgadura do véu, a grande reveladora de segredos.

É também a grandiosa desbravadora de caminhos. Não havia um caminho para o lugar Santo até que Jesus, ao morrer, rasga o véu; o caminho ao Santo dos Santos não foi manifestado até que Ele morreu. Se desejas aproximar-se a Deus, a morte de Cristo é o caminho para Ele. Se quer o acesso mais próximo e a comunhão mais íntima que uma criatura possa ter com seu Deus, eis aqui, o sacrifício de Cristo revela o caminho. Jesus não diz unicamente: “Eu sou o caminho”, mas sim que ao rasgar o véu, abre esse caminho. O véu de Sua carne, ao ser rasgado, o caminho até Deus é definido com claridade para cada alma crente.

E mais, a cruz elimina todos os obstáculos. Cristo, ao morrer, rasgou o véu. Então, entre Seu povo e o céu já não resta nenhuma obstrução, ou se há alguma, se os temores das pessoas inventam um obstáculo, o Cristo que rasgou o véu, continua rasgando-o, todavia. Ele rompe as portas de bronze, e parte em duas as barras de ferro. Olhem, em Sua morte, “Subirá o que abre caminhos diante deles… e a cabeça deles o SENHOR.” Ele abriu e aclarou o caminho, e todo Seu povo escolhido pode segui-lo ao glorioso trono de Deus.

Isso é representativo do espírito da dispensação sob a qual vivemos agora. Os obstáculos são eliminados; as dificuldades são resolvidas; o céu é aberto a todos os crentes.

3. Foi um milagre digno de Cristo. Detenham-se um minuto e adorem a seu agonizante Senhor. Por acaso Ele não singulariza Sua morte com um milagre assim? Por acaso não comprova Sua imortalidade? É certo que ele inclinou Sua cabeça à morte. Obediente à vontade de Seu Pai, quando se dá conta que chegou para Ele a hora de morrer, inclina Sua cabeça em um consentimento voluntário; mas nesse instante, quando o declaram morto, Ele rasga o véu do Templo. Por acaso não há imortalidade Nele, ainda que tenha morrido?

E vejam o poder que possuía. Suas mãos estão cravadas; Seu lado está a ponto de ser traspassado. Cravado ali, Ele não pode proteger-se dos insultos da tropa romana, porem em Sua debilidade suprema é tão forte que rasga o pesado véu do Templo de cima abaixo.

Observem Sua sabedoria, pois nesse momento, vendo o feito espiritualmente, Ele abre para nós toda sabedoria, e revela os segredos de Deus. O véu que Moisés colocou sobre seu rosto, é tirado por Cristo ao momento de Sua morte. A verdadeira Sabedoria, ao morrer, prega Seu mais grandioso sermão, rasgando o que se escondia do olhar dos olhos crentes: a suprema verdade.

Amados, se Jesus faz isso por nós em Sua morte, certamente seremos salvos por Sua vida. Jesus que morreu, agora vive, e nós confiamos que Ele nos conduzirá ao “santuário não feito por mãos.”

Antes de passar ao segundo milagre, eu convido a cada um de meus leitores que ainda não conhecem ao Salvador, a pensar seriamente nos prodígios que ocorreram em Sua morte, e julguem que classe de homem era Aquele que ofereceu Sua vida por nossos pecados. Seu Pai não permitiu que Ele morrera sem acompanhamentos milagrosos, para mostrar que Ele tinha aberto um caminho para que os pecadores pudessem se aproximar a Deus.

II. Passamos agora ao segundo milagre: “A TERRA TREMEU.”

O inamovível foi sacudido pela morte de Cristo. Cristo não tocou a terra: Ele foi elevado sobre a terra no madeiro. Ele morria, porem, ao deixar de lado Seu poder, no ato de Sua morte, Ele fez que a terra sob Seus pés, que nós chamamos de “o sólido globo”, tremesse. Qual foi o ensino disso?

Não significou, em primeiro lugar, que o universo físico pressentiu a última sacudida terrível que lhe espera? O dia chegará quando o Cristo apareça sobre a terra, e a seu tempo, todas as coisas que são, serão enroladas e desprezadas, como roupas velhas. Uma vez mais Ele falará, e sacudirá não somente a terra, mas também o céu. As coisas que não podem ser sacudidas permanecerão, porem essa terra não é uma dessas coisas: ela será deslocada. “a terra, e as obras que nela há, se queimarão” (2 Pedro 3:10) Nada permanecerá ante Ele. Somente Ele é. Essas outras coisas só parecem ser; e ante o terror causado por Seu rosto, todos os homens tremerão, e o céu e a terra sairão fugindo. Assim, quando Ele morreu, a terra parecia antecipar seu destino, e tremeu em Sua presença. Como irá tremer quando Aquele que vive de novo venha com toda a glória de Deus! Como tremeria, querido leitor, se você despertasse no mundo vindouro sem um Salvador! Como irá tremer naquele dia quando Ele venha para julgar ao mundo com justiça, e você tenha que comparecer diante do Salvador a quem desprezou! Pense nisso, eu lhe rogo.

Por acaso esse milagre também não significou o seguinte, que o mundo espiritual será movido pela cruz de Cristo? Ele morre na cruz e sacode ao mundo material, como uma predição que essa Sua morte sacudiria ao mundo submergido na perversão, e convulsionaria ao reino moral. Irmãos, pensem nisso. Nós dizemos: “Como moveremos alguma vez ao mundo?” Os apóstolos não se faziam essa pergunta. Eles tinham confiança no Evangelho que pregavam. Os que os escutavam viam essa confiança; e quando eles abriam suas bocas, os demais afirmavam, “Esses que transtornaram o mundo inteiro também vieram até aqui.”Os apóstolos criam que transtornariam ao mundo com a simples pregação do Evangelho.

Eu lhes rogo que vocês creiam no mesmo. Essa é uma cidade muito grande, essa cidade de Londres. Como poderemos comovê-la alguma vez? China, Hindustão, África: essas são imensas regiões. A cruz de Cristo será revelada a elas? Sim, meus irmãos, pois já sacudiu a terra, e ainda sacudirá às grandes massas da humanidade. Se só tivéssemos fé nela e perseverança para continuar com a pregação da Palavra, é só assunto de tempo para que o nome de Jesus seja conhecido por todos os homens, e todo joelho de dobre perante Ele, e toda língua confesse que Ele é o Cristo, para glória de Deus Pai. A terra certamente tremeu sob a cruz, e tremerá outra vez. O Senhor Deus seja louvado por isso.

Esse velho mundo: quantos anos já tinha existido, não posso dizê-lo. Não estamos com capacidade de calcular a idade do mundo, desde esse principio que é mencionado no primeiro versículo do Livro de Gênesis. Independentemente de quão velho tenha sido, tinha que tremer quando o Redentor morreu. Isso nos transporta para outra de nossas dificuldades. O sistema do mal com o que devemos de nos enfrentar tem estado estabelecido durante tanto tempo, e é tão antigo e reverente à antiguidade, que nos convencemos que: “não podemos fazer muito contra os velhos prejuízos.” Porem, foi a velha, velha terra que se estremeceu e tremeu sob o Cristo agonizante, e o fará outra vez.

Sistemas magníficos sustentados pela filosofia e a poesia, ainda se renderão diante do que se chama comparativamente a nova doutrina da cruz. Certamente não é nova, e sim mais antiga que a própria terra. É o próprio Evangelho de Deus, perpétuo e eterno. Abalará o antigo e venerável, tão certamente como o Senhor vive; e eu vejo a profecia disso no tremor da terra sob a cruz.

Parece impossível que a simples pregação de Cristo possa fazer isso, não é certo? E devido a tal, certos homens buscam proporcionar à pregação de Cristo todas as ajudas possíveis de música, de arquitetura e ao sei quantas outras coisas mais, até que a cruz de Cristo fica coberta com uma capa de invenções humanas, aplacada e enterrada pela sabedoria do homem.

Porem, o que foi que fez com que a terra tremesse? Foi simplesmente a morte de nosso Senhor, sem nenhuma adição de sabedoria ou poder humanos. Pareceria uma causa insignificante para que produzisse um resultado tão grande; mas foi suficiente, já que o “insensato de Deus é mais sábio que os homens, e o frágil de Deus é mais forte que os homens”; e Cristo, com Sua morte, é suficiente para fazer que a terra trema sob a cruz.

Vamos, aceitemos não usar nenhuma outra arma na batalha em que estamos empenhados, que não seja o Evangelho; nenhuma lança de combate que não seja a cruz. Somos capazes de crer que a velha, velha história, é a única história que deve se contar para reconciliar ao homem com Deus? Jesus morreu em lugar do pecador, o justo pelo injusto, um magnífico desenrolar da graça e da justiça de Deus em um só ato. Se pudéssemos nos apegar só a isso, veríamos rapidamente a vitória do lado de nosso conquistador Senhor.

Deixo esse segundo milagre, no que podem ver que o inamovível é sacudido, quando a terra tremeu.

III. Só uma ou duas sugestões sobre o terceiro milagre: AS ROCHAS SE PARTIRAM.

É-me informado que, ainda no presente, existem em Jerusalém certas evidências de rochas partidas do tipo mais inusitado. Os viajantes afirmam que não são do tipo que são produzidas por terremotos ou por qualquer outra causa conhecida. Sobre isso direi muito pouco; mas é algo maravilhoso que, quando Cristo morreu, quando Sua alma foi arrancada de Seu corpo, quando o véu do Templo se partiu em dois, assim a terra, sua parte rochosa, a estrutura mais sólida de todas, foi rasgada em abismos e precipícios em um só instante. Que outra coisa nos mostra esse milagre senão isso: que o insensível se sobressaltou? Como! Acaso as rochas podem sentir? Pois, se partiram ao presenciar a morte de Cristo. Os corações dos homens não responderam aos clamores agonizantes do Redentor moribundo, mas as rochas sim responderam: se partiram. Ele não morreu pelas rochas; contudo, as rochas foram mais sensíveis que os corações dos homens, pelos quais Ele derramou Seu sangue –

“Todas as coisas mostram algum sinal de razão,

Exceto esse meu insensível coração.”

Isso afirmou um poeta; e disse a verdade. As rochas podem se partir, mas os corações de alguns homens não se partem diante da visão da cruz. No entanto, amados, aqui está o ponto que pareço enxergar: essa obstinação e essa dureza de coração serão conquistadas pela morte de Cristo. Você pode pregar para alguém sobre a morte, e pode ser que ela não trema diante de sua certeza ou sua solenidade; contudo, lhe fale disso. Você pode pregar a alguém sobre o inferno, porem, ele endurecerá seu coração, como Faraó, contra o juízo do Senhor; no entanto, lhe fale disso. Devem usar todos os meios que possam comover um homem. Mas o que pode afetar grandemente ao coração mais obstinado e duro é o grandioso amor de Deus, visto tão surpreendentemente na morte do Senhor Jesus Cristo. Não me deterei para mostrar-lhes como é, porem, só lhes recordarei que é assim. No caso de muitos de nós, foi isso o que fez brotar de nossos olhos lágrimas de arrependimento, e nos conduziu a submetermos à vontade de Deus.

Eu sei que isso foi o que aconteceu comigo. Olhei milhares de coisas, porem não me abrandei. Mas quando:

“Vi a Um pendurado de um madeiro

Em meio de agonias e sangue,”

E morrendo ali por mim, então me dei golpes nos peitos, e senti amargura por Ele, como alguém que sente amargura por seu primogênito. Eu estou certo que seus próprios corações confessam que o grandioso quebrantador de rochas é o Salvador agonizante.

Agora bem, da mesma maneira que ocorre com vocês, assim encontrarão que acontece com outras pessoas. Quando tenham realizado seu melhor esforço sem alcançar êxito, utilizem esse último martelo: A cruz de Cristo. Muitas vezes vi gravada em latim, em peças de canhões, essa inscrição: “o último argumento dos reis.” Quer dizer, os canhões constituem o argumento final dos reis. Porem, a cruz é o argumento final de Deus. Se um Salvador moribundo não lhe converte, que coisa mais poderá fazê-lo? Se Suas feridas sanguinolentas não o conduzem a Deus, o que poderá fazê-lo? Se Jesus carrega com nossos pecados em Seu próprio corpo no madeiro, e quita o pecado, e se isso não te leva a Deus, com a confissão de teu pecado e o ódio até esse pecado, então já não lhe resta mais nada para você. “Como escaparemos, se descuidamos de tão grande salvação?” A cruz parte as pedras. Irmãos e irmãs, continuem ensinando sobre o amor do moribundo Filho de Deus. Continuem pregando a Cristo. Com isso, vocês abrirão túneis nos Alpes da soberba e nas colinas de granito do prejuízo. Encontrarão uma estrada para Cristo na intimidade dos corações dos homens, ainda que sejam duros e obstinados; e isso ocorrerá pela pregação da cruz no poder do Espírito.

IV. E agora concluo com o último milagre. Essas maravilhas se acumulam e dependem uma da outra. O tremor da terra produziu, sem dúvida, que as rochas se partiram; e as rochas partidas ajudaram ao quarto milagre. “OS SEPULCROS SE ABRIRAM.” As tumbas se abriram, e os mortos se levantaram. Esse é nosso quarto tópico.

É a grande consequência da morte de Cristo. Os sepulcros se abriram. O homem é o único animal que dá importância a uma sepultura. Algumas pessoas se preocupam pela forma em que serão enterradas. Essa é a última preocupação que jamais cruzaria minha mente. Eu estou persuadido que as pessoas me enterrarão por ódio, ou por amor, mas especialmente por amor a elas mesmas. Isso não deve nos preocupar. Porem, o homem frequentemente tem mostrado sua soberba por meio de sua tumba. Isso é algo estranho. Colocar grinaldas à forca é uma novidade, creio, que ainda não se perpetrou; mas amontoar mármore e impressionantes estátuas sobre uma tumba: que é isso senão adornar o patíbulo, ou mostrar a magnífica grandeza do homem quando unicamente sua nulidade é manifesta? Pó, cinzas, podridão, putrefação, e logo uma estátua, e todo tipo de coisas bonitas, para fazer-lhe crer que a criatura que retorna ao pó, depois de tudo, é alguém grande. Agora, quando Jesus morreu, os sepulcros foram abertos, e os mortos foram expostos: o que isso significa?

Eu creio que temos nesse último milagre “a história de um homem.” Ali jaz morto: decomposto, morto em delitos e pecados. Porem, em que belo sepulcro jaze! Assiste à igreja; é um dissidente, não conformista, qualquer das duas coisas que vocês prefiram; é uma pessoa muito moral, um cavalheiro, é um cidadão, é dono de sua companhia; será prefeito da cidade algum dia; é tão bom, oh, é TÃO bom! No entanto, não possui a graça em seu coração, não há Cristo em sua fé, não tem amor a Deus. Vocês vêem em que sepulcro está enterrado: uma alma morta em uma tumba dourada. Mediante Sua cruz nosso Senhor parte esse sepulcro e o destrói.

Quando valem nossos méritos na presença da cruz? A morte de Cristo é a morte da justiça própria. A morte de Jesus é uma superfluidade se nós pudéssemos nos salvar a nós mesmos. Se somos tão bons que não necessitamos ao Salvador, então, por que Jesus morreu sangrando-se sobre o madeiro? A cruz parte os sepulcros da hipocrisia, do formalismo, e da justiça própria nos quais estão escondidas as pessoas que estão espiritualmente mortas.

O que segue em continuação? Abre os sepulcros. A terra trinca. Ali jaz o morto, porem agora é revelado a plena luz. A cruz de Cristo provoca isso! O homem ainda não foi revivido pela graça, mas é conduzido a descobrir-se a si mesmo. Ele sabe que jaz no sepulcro do pecado. Recebeu o suficiente poder da parte de Deus para que esteja ali, já não como um cadáver tapado com mármore, senão como um cadáver do que o coveiro tirou os acúmulos de terra, e o deixou desnudo à luz do dia. Oh, é algo grandioso quando a cruz abre dessa maneira os sepulcros!

Você não pode convencer aos homens de pecado, exceto pela pregação de um Salvador crucificado. A lança com a que alcançamos os corações dos homens, é a mesma lança que traspassou o coração do Salvador. Temos que usar a cruz como o recurso para crucificar a justiça própria, e para fazer que o homem confesse que está morto em pecados.

Depois de que os sepulcros tinham sido abetos, e as tumbas se tinham rachado, que aconteceu em seguida? Se impartiu a vida. “Muitos corpos de santos que tinham dormido, se levantaram.” Eles tinham regressado ao pó; mas quando têm um milagre, este pode ser igualmente algo grandioso. Surpreende-me que tenha pessoas que possam crer sem dificuldade em um tipo de milagre, mas não aceitem outros. Uma vez que se tenha em conta a Onipotência, todas as dificuldades cessam.

Assim sucedeu com esse milagre. Os corpos se reintegraram subitamente, e ali estavam, completos e prontos para se levantarem. Que coisa tão maravilhosa é a implantação da vida! Não falarei dela em um homem morto, mas sim quero falar dela em um coração morto. Oh Deus, envia Tua vida a algum coração morto nesse momento, enquanto eu prego! Isso que dá vida as almas mortas é a morte de Jesus. Enquanto avistamos a expiação e vemos a nosso Senhor sangrando em nosso lugar, o Espírito Divino trabalha no homem, e o alento de vida é soprado nele. Ele tira o coração de pedra, e coloca um coração de carne que palpita com uma nova vida.

Essa é a maravilhosa obra da cruz: é pela morte de nosso Senhor que a regeneração vem ao homem. Não haveria novos nascimentos se não fosse por essa morte em especial. Se Jesus não tivesse morto, nós teríamos ficado mortos. Se Ele não tivesse inclinado Sua cabeça, nenhum de nós teria podido levantar a cabeça. Se Ele não tivesse ido de entre os vivos, na cruz, nós teríamos permanecido entre os mortos eternamente e para sempre.

Agora prossigamos, e vocês verão que essas pessoas que receberam a vida, a seu devido tempo saíram dos sepulcros. Está escrito que abandonaram suas tumbas. É claro que o fizeram. Quem entre os viventes desejariam permanecer em uma tumba? E vocês, queridos leitores, se o Senhor lhes dá vida, não permanecerão em suas tumbas. Se vocês estiveram acostumados a serem fortes beberrões, ou submetidos a qualquer outro pecado que os persegue, vocês o deixarão; não sentirão nenhum apego a seu sepulcro. Se viveram em companhia de ímpios, e encontravam a diversão em lugares questionáveis, não se deterão em suas tumbas. Não teremos necessidade de ir por vocês para afastá-los de suas antigas associações. Vocês mesmos estarão ansiosos de se afastarem delas.

Se alguém fosse enterrado vivo, e se desse conta que está dentro de um ataúde antes de exalar seu último suspiro, estou seguro que se os palmos de terra fossem tirados, e a tampa fosse quitada, ele não precisaria que lhe suplicássemos para que saísse de sua tumba; mas sim todo o contrário. A vida não ama a prisão da morte. Então que Deus conceda que o Salvador moribundo estenda Sua mão e os tirem das tumbas nas que ainda moram; e se agora lhes dá a vida, estou certo que a morte de nosso Senhor lhes fará entender que se um morreu por todos, então todos morreram, e que Ele morreu por todos, para que aqueles que vivem já não vivam mais para si, mas sim para Quem morreu e ressuscitou por eles.

Qual caminho essas pessoas seguiram uma vez que saíram da suas tumbas? É-nos dito que “vieram à cidade santa.” Exatamente isso. E todo aquele que tenha sentido o poder da cruz deveria se esforçar ao máximo em seu caminho à santidade. Anelarão unirem-se ao povo de Deus; desejará ir à casa de Deus, e ter comunhão com o três vezes santo Deus. Eu não esperaria que os que foram revividos quisessem ir para outra parte. Cada criatura busca sua própria companhia: as bestas buscam sua guarida, e os pássaros seus ninhos; e o homem restaurado e regenerado caminha até a cidade santa.

Por acaso a cruz não nos atrai para igreja de Deus? Eu não desejaria que alguém se unisse a igreja por qualquer outro motivo que não estivesse tomado das cinco feridas e do lado sangrante de Jesus. Nós nos damos primeiro a Cristo, e logo a Seu povo por Sua amada causa. É a cruz que realiza isso –

“Jesus morto no madeiro

Alcança essa maravilhosa vitória.”

É-nos informado, e com isso encerro essa maravilhosa história, que eles foram para a Cidade Santa “e apareceram a muitos.” Isso é, alguns deles que tinham sido levantados dos mortos, não o duvido, apareceram para suas esposas. Que espanto experimentariam quando vissem de novo a seus amados esposos! Pode ser que alguns deles apareceram a seu pai e mãe; e tampouco duvido que muitos pais e mães que ressuscitaram, apareceram primeiro a seus filhos.

O que isso nos ensina, senão que se a graça do Senhor nos levanta dos mortos, devemos ser diligentes em mostrar esse feito? Apareçamos a muitos. Que a vida que Deus nos deu seja manifesta. Não a escondamos, mas sim que vamos com nossos antigos amigos e façamos nossas epifânias como Cristo fez a Sua. Para Sua glória, nos manifestemos e apareçamos para outros. Glória ao Salvador moribundo! Todo louvor seja dado ao grandioso Sacrifício!

Oh, que essas minhas pobres palavras débeis motivem algum interesse em vocês acerca de nosso Senhor agonizante! Estejam prontos a morrer por Ele. E vocês que ainda não o conhecem, pensem nesse grandioso mistério: que Deus tomou a natureza de vocês e se fez homem e morreu, para que vocês não morram; ele carregou com seu pecado para que vocês fossem liberados dele. Venham e confiam em meu Senhor hoje, os suplico. Enquanto o povo de Deus se reúne à mesa para partir o pão, que seus espíritos se dirijam com prontidão, não a mesa nem ao sacramento, mas sim ao próprio Cristo e a Seu sacrifício. Amém.

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Porção da Escritura lida antes do Sermão: Mateus 27:35-54

[1] Koh-í-noor (nome que significa Montanha de Luz) é um dos diamantes mais famosos do mundo. Em 1850, quando a Grã-Bretanha anexou a Índia ao Império, e depois a Rainha Vitória foi declarada Imperatriz da Índia, ela recebeu o Koh-í-noor das mãos de Lorde Dalhousie. Atualmente essa célebre pedra preciosa pesa 108,8 quilates, pertence à Coroa britânica e desde 1937 ornamenta uma coroa especialmente feita para a rainha-mãe, para o dia da coroação do seu esposo, o rei Jorge VI
(Wikipédia)

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