por Daniel TC
Tive ajuda do excelente livro “O Sofrimento e a Soberania de Deus” (organizado por John Piper e Justin Taylor, Editora Cultura Cristã) e da pregação do pastor Emilio Garofalo sobre o salmo 22 (disponível aqui) para escrever esse post.
“Achadas as tuas palavras, logo as comi; as tuas palavras me foram gozo e alegria para o coração, pois pelo teu nome sou chamado, ó SENHOR, Deus dos Exércitos. Nunca me assentei na roda dos que se alegram, nem me regozijei; oprimido por tua mão, eu me assentei solitário, pois já estou de posse das tuas ameaças” Jeremias 15.16-17
“Tendo Jeremias entrado nas celas do calabouço, ali ficou muitos dias.” Jeremias 37.17
Solidão dos santos.
Jeremias não é o único personagem bíblico a sofrer com a solidão por causa da justiça: sabe-se que o fim de quase todos apóstolos foi o martírio, que envolve uma dura solidão final; o apóstolo João foi exilado para Patmos, onde teve a oportunidade de ficar solitário por um bom tempo; Jó perdeu sua família quase toda e experimentou solidão até seus amigos chegarem – e continuou experimentando solidão com seus amigos por lá! Certamente Paulo teve muitas horas de solidão em sua prisão; Elias sentia-se profundamente só, no deserto, quando Deus o avisou dos sete mil que se mantiveram fiéis (1 Reis 19). A solidão atinge os santos do Senhor. E isso não é um acidente de percurso.
A solidão de Jeremias existe por causa de sua fidelidade (e não “apesar dela”): Jeremias era um fiel profeta do Senhor, anunciando a sua Palavra. O sofrimento ligado à solidão não era fruto de uma idolatria do coração de Jeremias. Além disso, ele não era solitário por ser “muito apegado a características de sua própria personalidade”. Jeremias não era solitário simplesmente por ser chato.
Ainda assim, Jeremias e os outros santos solitários da Bíblia sofreram com a solidão.
Solitário bem-aventurado.
O termo que é traduzido como “bem-aventurado” na maioria das nossas Bíblias significa literalmente “feliz” ou “mais do que feliz”. Em Lucas 6.22 lemos:
“Bem-aventurados sois quando os homens vos odiarem e quando vos expulsarem da sua companhia, vos injuriarem e rejeitarem o vosso nome como indigno, por causa do Filho do Homem.”
Olhe para a vida desses homens. Eles sofrem com a perseguição. As surras e apedrejamentos doem. O desprezo machuca. A solidão e a rejeição incomodam. Jesus não está dizendo que essas coisas não vão acontecer, pelo contrário, ele afirma claramente que a perseguição, em algum grau, atingirá os seus discípulos (ver João 15.20). Vemos essa perseguição de uma forma violenta e contundente ainda hoje (ver http://www.portasabertas.org.br/ ) mas também de formas mais sutis e abrangentes. No entanto, contrariando nosso estúpido e caído “senso comum”, Jesus diz que quem passa por isso é “mais do que feliz”. Como?
O propósito de Deus na solidão dos santos.
“Regozijai-vos naquele dia e exultai, porque grande é o vosso galardão no céu; pois dessa forma procederam seus pais com os profetas.” (Lucas 6.23)
“Deus, porém, nos disciplina para aproveitamento, a fim de sermos participantes da sua santidade” (Hebreus 12.10)
Sob a perspectiva da eternidade, mantendo nossos olhos firmes no céu, conseguimos enxergar algo maior do que a solidão temporária. A solidão, no fim das contas, é um dos resultados da queda, mas Deus torna o mal em bem (como em Gn 50.20) para nosso amadurecimento na fé. Além disso, temos a promessa de Romanos 8.28:
“Todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que foram chamados segundo o seu propósito.”
Quando o apóstolo, inspirado pelo Espírito Santo, escreveu ‘”todas” as coisas’, ele certamente estava incluindo a solidão. Embora não seja fácil compreender quando não conhecemos a história inteira (lembre-se: Jó não leu o primeiro capítulo do livro que leva seu nome!). E nós somos chamados a confiar nessa promessa (e em muitas outras).
O Salvador solitário.
“Quero trazer à memória o que me pode dar esperança.” (Jeremias 3.21)
Além da igreja perseguida e dos santos solitários do passado, temos um outro exemplo de solidão na Bíblia em Jesus Cristo. Tanto no início de seu ministério, quando foi para o deserto ser tentado, como no final, quando chamou seus amigos para orarem com ele mas acabou tendo que orar sozinho, Jesus experimentou a solidão. E por ter experimentado a solidão, Jesus é plenamente consciente da dor que ela causa, e é completamente capaz de nos ajudar a passar por períodos (curtos como um dia ou longos como uma vida) de solidão.
Nosso Salvador não nos deixou sem instrução. Em sua Palavra podemos ver como a fé em suas promessas e a companhia dos santos podem nos dar a força para passar pelo deserto da solidão. Da mesma forma que Jeremias, devemos nos encher de esperança relembrando as promessas maravilhosas de Deus, bem como seus feitos grandiosos do passado.
Por fim, Jesus também experimentou um outro tipo de solidão. Um tipo que nós nunca precisaremos experimentar. O “Deus Conosco” sofreu, em nosso lugar, a separação do Pai, de uma forma que nós (que nos refugiamos em Jesus) nunca sofreremos. Em Mateus 27.46, vemos o Senhor gritando “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”. Aquela solidão completa, quando Deus, o Pai, derramou sua ira sobre Jesus e, em vez de resplandecer sua face sobre ele, virou o rosto, aquela solidão, nós jamais experimentaremos. E da mesma forma que o Salmo 22 (que Jesus citou nessa passagem) é recheado de esperança (veja os versos 3, 4, 5, 9, 10) e termina com mais esperança ainda (verso 19 em diante) mesmo diante do sofrimento, também nossa vida deve ser cheia de esperança e confiança.
A solidão não é a realidade última: ainda que demore, a solidão um dia vai acabar completamente, junto com os outros efeitos da queda. A companhia contínua do Senhor, Deus Conosco todos os dias, até a consumação do século, essa é a verdade que deve encher nossos corações.
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